segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Porcessos de colonização da America DO sul '


                        A colonização da América do Sul

A questão da temporalidade da ocupação humana no Brasil é um dos problemas mais antigos da arqueologia brasileira. Desde os trabalhos pioneiros de Peter W. Lund, há mais de 150 anos atrás, questões como a cronologia das primeiras ocupações humanas, a contemporaneidade dessas ocupações com uma megafauna hoje extinta, e as origens biológicas das primeiras populações têm sido investigadas e debatidas nos meios acadêmicos. Ainda hoje, não há um consenso quanto a estas questões. Asserções quanto a uma ocupação datada de pelo menos 35.000 anos foram feitas para o sítio arqueológico Pedra Furada localizado na região de caatinga do nordeste brasileiro, no estado do Piauí. Controvérsias quanto à natureza humana de possíveis artefatos líticos, quanto à natureza das amostras de carvão datadas e a associação destas amostras com o material lítico, e quanto a problemas estratigráficos e tafonômicos (i.e., formação do sítio arqueológico) são questões ainda não resolvidas. Existe na realidade um problema intrínseco com o material arqueológico e o contexto em que este foi encontrado em Pedra Furada, de tal maneira que mesmo que fossem encontradas, no futuro, evidências indiscutíveis de uma ocupação humana na América há mais de 35.000 anos, ainda assim elas não iriam validar os achados de Pedra Furada.
Evidências bem documentadas da ocupação humana no Brasil datam do final do Pleistoceno, com as datações radiocarbônicas mais antigas atingindo ca. 11.000 AP. Apesar de que mesmo essas datações necessitam de um melhor refinamento cronológico, elas têm tido uma maior aceitação nos últimos anos por parte da comunidade acadêmica internacional. Os principais sítios datados do Pleistoceno Terminal com ótimas evidências arqueológicas (e.g., cultura material indiscutível, associações estratigráficas bem claras, restos humanos etc), que têm sido objeto de estudos nas duas últimas décadas, estão localizados na Amazônia (sítio Caverna da Pedra Pintada), no Mato Grosso (sítio Santa Elina), em Goiás (vários sítios na região de Serranópolis), em Minas Gerais (sítios Lapa do Boquete, Lapa dos Bichos, Santana do Riacho, Lapa Vermelha), em Pernambuco (sítios Brejo de Madre de Deus-Abrigo 3 e Chão do Cabloco), e no Piauí (níveis superiores dos sítios Boqueirão da Pedra Furada e Sítio do Meio).
Apesar da importância e do apelo popular sobre a antiguidade da ocupação pré-histórica do Brasil, esta discussão tem que se dar dentro de um contexto paleoantropológico mais abrangente, no qual questões sobre evolução humana, tanto nos seus aspectos biológicos quanto culturais, sejam estudadas dentro da perspectiva evolutiva e histórica das grandes mudanças que ocorreram durante o período pós-glacial no mundo.
No Brasil não há nenhuma evidência de que a megafauna foi explorada pelos grupos que aqui chegaram no final do Pleistoceno. O problema aqui pode residir em uma questão temporal. Ainda não sabemos ao certo se houve uma contemporaneidade entre megafauna extinta e populações humanas Apesar do crescente número de estudos paleontológicos entre nós, não temos a mínima idéia sobre a cronologia do aparecimento e da extinção de nenhuma das espécies de mamíferos do Brasil. No Brasil Central, onde os estudos de paleontologia brasileira se iniciaram há mais de 150 anos, até este ano só tínhamos uma datação, e esta indireta, para espécies extintas. Carvões associados a níveis estratigráficos, nos quais ossos e coprólitos de uma preguiça terrícola (Catonyx cuvieri) foram escavados, no sítio arqueológico de Lapa Vermelha IV na região de Lagoa Santa foram datados em 9.580±200 AP. Recentemente pesquisadores do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos da Universidade de São Paulo (LEEH/USP) obtiveram uma datação de 9.990±40 AP para os ossos de uma preguiça gigante da mesma espécie da de Lapa Vermelha IV encontrada no sítio paleontológioco Cuvieri, também na região de Lagoa Santa. A ocupação humana mais antiga para a região é de ca. 10 mil anos atrás1. Portanto é possível que em Lagoa Santa as primeiras populações tenham chegado na região logo após a extinção da megafauna. Essas datações precisam ser confirmadas com uma série bem mais representativa do material paleontológico e arqueológico, assim como um estudo aprofundado quanto a questão de possíveis contaminações do material datado, pricipalmente ossos que são mais suscetíveis à contaminação.
Por outro lado, os vestígios arqueológicos datados do final do Pleistoceno e começo do Holoceno no Brasil Central e Amazônia sugerem um padrão de subsistência baseado em coleta de frutos e sementes complementada pela caça generalizada de animais de pequeno e médio porte. Estudos teóricos que utilizam-se da teoria de ecologia evolutiva, aliados a estudos empíricos (e.g., escavações, análise de coleções etc), que estão sendo realizados por pesquisadores e estudantes do LEEH/USP, têm demonstrado uma grande diversidade cultural dos primeiros colonizadores do continente.
O processo evolutivo e histórico da colonização do continente americano é bem mais complexo e difícil de se traçar, assim como em outras regiões do mundo. As pesquisas mais recentes indicam várias "populações-fundadoras" com origens diferentes, entrando no continente em diferentes períodos, trazendo diferentes hábitos, tecnologias e ideologias. As pesquisas que estão sendo realizadas no Brasil têm tido uma posição de destaque na produção deste conhecimento.

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